sexta-feira, 30 de maio de 2008

Surreal






Ao fundo o entardecer
assinala sua silhueta
realçada como um vulto
que se perde no campo
de lavanda.


O perfume adere-se
impregna a hora áurea
em nota olfativa
afirmada na essência
do entardecer.


Leve, a aura da tarde:
lívida vívida vida violácea...
entretons gradativos
sugerem sutil desmaiar
da hora que se esvai...


Um perfil construído
quadro vivo da memória
um sentimento decalcado
da natura paisagem.


A tarde é o espelho-alma!
É justo que se ajuste sua sombra
ao fundo do entardecer.


No campo da visão
se confundem imagem-
sombra
em pura púrpura cor.


Pululam o olor e a poesia...


O que se confunde não é a imagem-
sombra
não é o perfume campestre
chamado saudade
mas tão somente
um pétala memorial.


Ajusto sua sombra
imagem-saudade
delicadeza da lembrança:
deja vu...

Deixo vir todas as cores
O olor ora fugaz, ora raiz,
qual sonho Dali
transcende e acende
o fulgor à flor do sexo...
Complexo nexo do amor.
Réstia de sol vai lhe trazer
por entre as tintas florais,
onde incide a delicadeza.
Deixo vir todas as cores
no perfume campestre.
Sonho Dali
transcendendo o relógio
que escorre entre o tempo e o atemporal
daquilo que não se assina
no campo da visão:
Olhar de artista.



30.05.2008

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Palinódia


Para desdizer, o in.verso,
todos os sonetos-bolores,
os poemas de desamores,
as tintas mofadas no verso.



Para desdizer imagens, ações,
os adjetivos todos, obscuros,
as letras malditas, os impuros
nomes, inglórias, pontuações.



Palinódia para parar de doer
as almas dos poetas mortos,
encostadas em mágoas e portos,
encrustradas de amargura e fenecer.



Respirar ar puro, limpar pulmões...
Ar, pedra, carvão ou ferro?! Minério
transformado em energia e mistério!
Combustível da alma dos rincões!



Ode e rancor, não! Palinódia e sol,
um soul maior, um som, bemol!
Hai kai do sou nascente ocidental
Um poema para desdizer a Dor total.









03.11.2004




Ritual


Arrumei a casa, lavei a louça...
Ouça a sonata da tarde leve!
Leve em consideração
o pequeno som que faz a brisa:
soneto da tarde.


O vento entre a folhagem, lá fora!,
fora a roupa perfumada e o lençol,
brincando no varal, albente,
ente puro em movimento:
momento...


Ser puro movimento puro:
a leveza do Ser escorre, fresca
feito água límpida na fonte!


A tarde é toda minha!


Então, estendi a cama,
varri todo o terreiro,
lavei minhas vidraças,
abri minhas cortinas
para os olhos verem a vida.


Agüei plantas, floresci o dia,
forrei a mesa com renda nordestina,
toalha branca de puro amor!

Incensei de lótus, as quatro estações,
perfumei a casa com o cheiro da alegria.

Um banho n'água tépida pra lembrar
o útero da vida benfazeja!
Banhei-me, sim!


Sentei-me, enfim, lívido e pleno,
a esperar a chegada do Amor.




23.01.99

A Palavra em Canto ( desdobrarte )


A espiral da palavra-som
soa sobre a sombra de todo tom
que expira invernos
e respira verões azuis.

Soa, soma e aspira
ao dom de desdobrar no ar,
em pomos de adão,
pecados espiralados
na pira vocal que arde,
queima, conspira em lira, delira,
em prol de toda canção,
o som sensual da sonata mais doce.

Doce pecado me cobra
a obra do meu cantar!

Tenho meus paraísos...

A espiral do som-palavra
lavra o tom-fruto-arte,
livra o dom, flutuar-te, leve...

Leva ao veio central
onde respiro, inspiro,
o espírito do instrumento,
o movimento que na borda
transborda melodias frasais.

Envolve,volve, dissolve...
Devolve a mim a espiral do verso.

Quem se espicha no tempo,
no ar, no som projetado e caudaloso?

Será a voz, a canção, a palavra, eu?!

Quem se desd.obra?!

Em mim, espiral da canção,
a Voz tende à extensão dos meus dós,
espraia, nas ondas do ar, os meus tons,
meus ais a desdobrar-me em arte
até - quem sabe?! - desd.obrar-te.





29.01.98